quinta-feira, 20 de maio de 2010

Um pouco da França na música brasileira e Gainsbourg na Educadora FM

Serge Gainsbourg/foto divulgção

Artistas como Serge Gainsbourg influenciam cada vez mais músicos brasileiros da nova geração
Plantão Publicada em 17/05/2010 às 08h24m
Leonardo Lichote

RIO - Talvez seja exagero falar em invasão francesa. Mas tons brancos, azuis e vermelhos vêm se insinuando - ora com sutileza, ora de forma evidente - na música brasileira contemporânea. Versos em francês aqui, um acordeom puxando o clima chanson ali, ecos cool-cafajestes de Serge Gainsbourg acolá, um clima de cabaré parisiense em outro canto... Com trabalhos independentes, por caminhos diferentes e vindo de vários estados do Brasil, um grupo heterogêneo de artistas - Renato Godá, 3namassa, Les Responsables, Thiago Pethit, Bande Ciné, Edgard Scandurra & Les Provocateurs... - encontra na terra e na música de Edith Piaf e Nino Ferrer um ponto de interseção.

O compositor paulistano Thiago Pethit tem sua obra e trajetória ligada fortemente a essa tradição. As canções de seu recém-lançado CD "Berlim, Texas" ecoam a chanson de Piaf, Jacques Brel e Charles Trenet ("Sempre ouvi esses artistas, assim como Gainsbourg; eles entram no meu trabalho de um jeito muito natural"). Uma delas, "Voix de ville", é cantada em francês, num arranjo que evoca a atmosfera musical do >ita
- Até as músicas minhas que não têm essa referência escancarada, como "Uma canção francesa" ou "Voix de ville", carregam a estrutura da chanson. São músicas que não têm refrão, quase sempre num compasso ternário bem específico - nota Pethit. - Como ator, sou muito fã da Nouvelle Vague. Queria ser Doinel (personagem de Truffaut vivido por Jean-Pierre Léaud em vários filmes)! Mais que uma construção artística, portanto, esse lado francês faz parte da minha construção de caráter (risos).

A França do compositor não é só de Nouvelle Vague (o movimento cinematográfico) e chanson. Seu maior ídolo é a cantora francesa Camille, que já gravou com a Nouvelle Vague (a banda). O recente show do grupo francês no Rio, aliás, foi aberto por Pethit.

A mesma turnê da Nouvelle Vague, quando passou por Recife, teve no show de abertura a Bande Ciné. O grupo, que prepara seu segundo EP, faz um trabalho declaradamente calcado na música francesa - desde as releituras para os clássicos até suas próprias composições. A França chegou a eles - ou ao idealizador, compositor, cantor e guitarrista Filipe Barros - há cinco anos, via uma coletânea da cantora France Gall.

- Era uma música viva, cheia de referências ao que vinha acontecendo no mundo nos anos 60, que cantava em vários idiomas e experimentava várias sonoridades. Era um som cheio de esquisitices também e que misturava gêneros como jazz, chá-chá-chá, música oriental, samba, bossa-nova, rock, iê-iê-iê, boleros - lembra Barros. - Depois desse disco, abriu-se uma porta musical. Aí vieram Brigitte Bardot, Serge Gainsbourg, Jacques Dutronc, Nino Ferrer, Alice Dona etc.

O repertório da Bande Ciné inclui uma regravação de uma canção gravada por Brigitte Bardot: "Tu veux ou tu veux pas", versão da brasileiríssima "Nem vem que não tem", sucesso com Simonal. A canção evidencia que esse nova onda (nouvelle vague?) francesa na música brasileira é apenas um trecho de uma longa via de mão dupla ("Toda essa geração do Gainsbourg foi influenciada pela bossa nova", nota Pethit).

- Foi massa também escutar Serge Gainsbourg cantando um frevinho ("Les sambassadeurs") e Bardot cantando "Maria Ninguém". E, no lado oposto, identificar músicas de Reginaldo Rossi que eram versões de Nino Ferrer ("Les cornichons" virou "Deixa de banca") e Christophe ("Les marionettes" virou "A marionete"). Aliás, muita gente diz que a beatlemania foi a principal responsável por ofuscar essa cena francesa dos anos 60.

O paulistano Renato Godá, que acaba de lançar o CD "Canções para embalar marujos", conta que um de seus pontos de contato com a França é, justamente, a... Jovem Guarda. Em seu disco - que emana fumaça de cabaré e acordeons boêmios com sotaque francês, em meio a outras influências - ele grava "Nasci para chorar", versão de uma música italiana feita por Erasmo Carlos e lançada por Roberto Carlos.

- A chanson teve um papel importante para essa geração da década de 60 - nota Godá, que toca dia 26 de junho no Cinematheque.

A relação do artista com a música francesa nasceu de tabelas como essa, via Jovem Guarda. A principal delas foi a música cigana, influência declarada dele, e cuja presença é forte na tradição da França. Mas há também uma ligação - que passa pela própria imagem de Godá e pela temática de suas letras - com o universo boêmio de Gainsbourg.

- Tenho, como ele, esse romantismo masculino, cafajeste, que fala de amor e sacanagem ao mesmo tempo. Café, cigarro, uísque... O universo dele é o meu. Também gosto de andar na corda bamba entre o brega e o cult. A chanson é isso.

Godá conta que, pelo contrário, foi a França que veio até ele, quando o artista francês JP Nataf conheceu seu trabalho, se aproximou e disse: "Você tem que vir aqui". Foi, teve uma boa recepção de sua música, absorveu referências mais diretamente francesas e conheceu músicos como a cantora Barbara Carlotti, que participa de seu disco, em "Chanson d'amour".

A história de amor França-Brasil da banda gaúcha Les Responsables também parte de lá para cá. Ela começou quando o francês Erwan Pottier veio para o Brasil fazer seu doutorado em Sociologia. Um dia, um colega sugeriu que ele fizesse uma banda cover de Gainsbourg.
- Só que logo me cansei da atmosfera cabaré, dessa coisa meio Aznavour. Queria fazer algo mais rock'n'roll, mais ousado - conta Pottier.
http://oglobo.globo.com/cultura/mat/2010/05/16/artistas-como-serge-gainsbourg-influenciam-cada-vez-mais-musicos-brasileiros-da-nova-geracao-916594572.asp

Não percam o primeiro capitulo da saga Serge Gainsbourg #1 1958-1967, Conexão França-Bahia #3, na Educadora FM sábado 22 às 12h

Nenhum comentário:

Postar um comentário